É preciso saber viver!

Publicada em 22 de setembro de 2023

É preciso saber viver!

Nossa homenagem ao Dia da Luta Nacional das Pessoas com Deficiências: 21 de setembro

Temos uma história pra contar. A história de Sandra Lourdes Farina e Gilson de Oliveira Ramos. Eles moram em Luís Eduardo Magalhães (BA), e nos último 21 anos vêm lidando com uma grande benção e um grande desafio.

A benção é o filho Theodoro Farina Ramos, que nasceu em 2002. O desafio é lidar com surdez bilateral profunda que ele apresenta. Essa história é recheada de momentos difíceis, mas também traz mensagens surpreendentes de força e superação.

Depois do choque de descobrir a condição do filho, toda a família se empenhou em fortalecer e melhorar a qualidade de vida dele. E está dando certo!

Theodoro completou o ensino fundamental, o ensino médio e está na faculdade. Neste meio tempo, aprendeu Libras, informática, fez CNH. Aprendeu desde cedo a desenvolver sua autonomia para não se privar de nada na vida social: festas, cinema, viagens, tecnologia.

Os tratamentos e buscas de alternativas para a condições dele nunca pararam, mas somente em 2016 ele pode fazer o Implante Coclear, que lhe daria a chance de ouvir e conquistar ainda mais autonomia e qualidade de vida.

O processo que é lento, mas eficiente. O momento em que ligaram o processador e ele ouviu o primeiro som de sua vida foi único, emocionante.

Agora, com o auxílio de terapias e atividades cotidianas que estimulam seu ganho auditivo, Thoeodoro está apresentando evolução significativa. Mas o melhor dessa história é que apesar das dificuldades, que são muitas, ele sempre foi uma criança feliz e se tornou um adulto meigo, amável, responsável, educado e querido por todos.

E assim, a família segue a vidas buscando sempre o que há de melhor para que o futuro seja de dias repletos de harmonia, paz e realizações. E lutando para que a sociedade civil e a classe política olhem com mais respeito, sensibilidade e responsabilidade para pessoas com diferentes deficiências.

  • É preciso estruturar as escolas.
  • É preciso capacitar os profissionais.
  • É preciso aumentar o número de entidades especializadas.
  • É preciso criar leis que assegurem os direitos das pessoas com necessidades especiais.
  • É isso que a família Farina Ramos espera. É isso que nós esperamos. 

Confira a história completa.

“Sou Sandra Lourdes Farina, esposa de Gilson de Oliveira Ramo. Moramos em Luís Eduardo Magalhães (BA), cidade acolhedora que se tornou o melhor lugar do mundo. Aqui instituímos nossa família com muito amor, cumplicidade e compromisso.

E, assim, no ano de 2002 nascia um menino, muito desejado pelos pais e seus familiares. Tudo transcorria dentro da normalidade, até que nos questionamos porque ele não respondia quando era chamado ou a qualquer som. Indagamos a pediatra, esta fez alguns testes e não obteve respostas. Nos encaminhou a um especialista. Solicitou uma série de exames, alguns foram necessários fazer fora da cidade pois aqui não eram realizados, na época a cidade era bem precária no setor saúde. Mesmo com as dificuldades em relação à distância, não impediram que buscássemos respostas para melhorar a vida do nosso filho. Na medida que nos solicitavam íamos realizando os exames, porém não tínhamos resultados que indicassem perda auditiva. Somente quando passou pelo exame BERA, houve a constatação de que apresentava surdez bilateral profunda.

Estratégia de vida

Foi um choque, parecia que havíamos caído em um abismo profundo. Mas, precisávamos nos fortalecer e buscar estratégias para melhorar a qualidade de vida dele. Começaram as fono terapias, no início aqui na cidade, depois passamos a frequentar as sessões no município vizinho que fica à 80 km de distância.

Além das terapias que estimulavam a fala introduzimos a língua de sinas. Outro desafio, foi preciso aprendê-la, porém meu trabalho às vezes impedia que frequentasse as aulas, assim passei a estudar em casa, mais tarde fui fazer o curso para melhorar a comunicação e obter a certificação.

Nessa época a Secretaria Municipal de Educação oferecia o curso da Libras (atualmente não tem mais a oferta do curso).

Ainda pequeno ele aprendeu Libras e Língua Portuguesa, foi um desafio para mim no papel mãe e professora pois, era tudo novo e não podíamos deixar para depois assim, de cada dificuldade tornamos uma vitória.

Lembro sempre do prefácio de um livro que li, ”não fique lamentando, procure fazer o melhor possível para o outro”. E assim me fortaleci ainda mais para seguir em frente.

Chegou a hora de nosso filho frequentar à escola. O que fazer?

Ensino Regular

Matriculamos na escola ensino regular (particular), a escola não estava preparada para atender criança com essa necessidade. Tornamos-nos parceiros (família X escola), ministrei minicurso aos professores da escola para auxiliar no atendimento, já que a escola não oferecia acompanhante para interprete. Logo após, foi transferido para a rede municipal de ensino pois oferecia profissional para acompanhar frequentou do 1ºano ensino Fundamental I até o 9º ano do Ensino Fundamental II.

Chegou a vez do Ensino Médio.

Lá vamos nós novamente enfrentar novas batalhas. E, não foram poucas. Essa fase ficou complicada, passamos dias difíceis, uma luta para conseguir um profissional para acompanhar durante as aulas e outra para lidar com a escola, muita burocracia. Para felicidade geral, depois de tanta cobrança conseguimos normalizar a situação, fomos os pioneiros nessa escola, mas valeu a pena, através da nossa batalha hoje existe uma sala para atender outras necessidades. Isso nos deixa muito felizes.

Como a vida é feita de fases, chegou a vez do Ensino Superior.

Ele escolheu um curso bem fácil e simples. Optou por Engenharia Mecânica. Felizmente a instituição ofereceu tradutor. As aulas iniciaram, tudo indo bem. Até que chegou a pandemia da Covid-19. As aulas passaram a ser virtuais, nesse período passei a acompanhá-lo fazendo a tradução. Complicou um pouco porque minha área é Pedagogia, dessa foram precisava estudar para poder ajudá-lo nos cálculos. Tempos difíceis. Alguns semestres depois Theodoro falou que estava bem difícil acompanhar e que gostaria de dar um tempo.

Atualmente está cursando Educação Física - Uniasselvi. Mesmo com a tradutora virtual, continuo acompanhando nas aulas, trabalhos e atividades.

No município não existe associação para surdos. Anos atrás tentamos formar, mas infelizmente não obtivemos sucesso. Algumas escolas da rede municipal possuem salas multifuncionais, onde os alunos frequentam no contra turno para receber atendimento especializado para ajudar no processo ensino aprendizagem.

As dificuldades não se limitaram apenas na escola outros serviços também, como médicos, dentistas, comércio em geral, pois não conhecem a língua de sinais e não há interesse em oferecer tradução. Sempre que necessita de algum atendimento preciso acompanhar para fazer a tradução. Como por exemplo quando foi fazer curso de informática, para a CNH nas aulas do SUPERA entre outras. Me sinto feliz em fazer parte de cada momento, nossa cumplicidade é muito grande.

Já ouvi muito de profissionais “preciso aprender Libras”, infelizmente não acontece, mesmo que seja obrigatório e um direito da pessoa surda, porém torna-se uma grande despesa tanto para o governo como para os privados. Dessa forma vai caiando no esquecimento e as pessoas não dão o devido valor.

Família

O importante, é que sempre tivemos o apoio dos familiares, amigos e conhecidos isso nos fortaleceu e contribuiu para buscamos as melhores formas de minimizar as dificuldades, mostrando os pontos positivos e negativos do cotidiano, ensinando desde cedo para que desenvolvesse sua autonomia, nunca o privamos de nada na sua vida social, festas, cinema, viagens, tecnologia ... Sempre foi uma criança feliz e se tornou uma pessoa meiga, amável, responsável, educado e querido por todos. Isso nos deixa orgulhosos.

Nesse percurso nunca paramos com tratamentos e buscas de alternativas, tentamos o implante coclear, por duas vezes ele foi reprovado. Ficamos tristes e decepcionados pois queríamos dar mais qualidade de vida. Mas, não paramos de buscar outros centros que ofereciam o IC.

Somente no ano (2016), recebemos a melhor notícia, que ele poderia fazer o Implante Coclear o que daria ao nosso filho a chance de ouvir e assim conquistar ainda mais sua autonomia e qualidade de vida.

Iniciamos consultas, tratamentos, exames, mesmo com uma certa demora o grande momento chegou, recebemos a notícia que ele era candidato ao implante. Foi uma mistura de sentimentos, alegria, preocupação ... e em 2022 aconteceu e tudo saiu como esperávamos.

Ah, as fases....

A partir do IC novas adaptações, tendo em vista o processo que é lento, mas eficiente.

Foram muitas emoções no momento em que ligamos o processador e ele ouviu o primeiro som da sua vida, minha voz. Lágrimas de alegria rolaram. Com auxílio de terapias e atividades cotidianas que estimulam seu ganho auditivo está apresentando evolução significativa, o que nos deixa felizes .

Seguimos com nossas vidas buscando sempre o que há de melhor para que o futuro seja de dias repletos de harmonia, paz e realizações.

Foi difícil? Foi.

Mas, não desistimos”.

Por Sandra Lourdes Farina